Tu podes fingir-te de morta quantas vezes quiseres.
Há de haver sempre uma janela por onde fugir.
O homem do telejornal disse que tenho uma bactéria a comer-me o interior das coxas e o recheio dos meus testículos. As bactérias querem entrar pelo meu escroto desidratado para poderem nadar nuas na minha imaginaria corrente sanguínea.
A minha pele está a quebrar-se com a pressão.
Avisaste me para prováveis surpresas e futuros beijos.
Avisaste me que um dia me ias roubar o Ar.
Eu tenho medo.
Eu não encontro saída, eu toco nos espelhos mas eles não se abrem. Eu danço e conto histórias para os espelhos mas eles não se abrem. Eu roubo-te o baton e escrevo o teu nome no espelho, mas ele não se abre.
Eu não encontro saída. As portas abrem-se e fecham-se para a casa respirar mas as superfícies que um dia reflectiam luz, ficaram baças e antigas.
Trago o teu feto contigo.
Não é cerveja. É um bebé morto. Feto, feto, feto.
Tira-me uma foto agora. Prende-me a algum lado para eu um dia poder fugir.
Nós discutimos.
Nós discutimos porque somos pobres. A nossa comida é diferente da dos ricos. Os nossos filhos discutem como nós discutimos. Discutimos porque a nossa comida é diferente.
Os ricos querem que nós estejamos sempre a discutir, para nós não conseguirmos organizar-nos e roubar-lhes o lucro que deus nos prometeu.
Nós discutimos porque somos pobres. A nossa comida depois de comprada é chupada e mastigada. Entretanto nos nossos mentirosos estômagos, elas se vão lentamente decompondo em gases que nos fazem rir, chorar e discutir.
Eu cheiro o teu bafo e por vezes consigo rir, outras vezes vêem me lágrimas aos olhos mas na maioria das vezes nos discutimos quando cheiramos o bafo um do outro.
Temos de mudar de comida. Temos de comer em turnos para que um de nós coma bem e o outro não coma nada. E depois trocamos.
Na maioria dos dias eu sinto me trocado. E para equilibrar o jogo vou te substituindo um centímetro cúbico de carne por dia, se te aperceberes de que te ando a morder. Eu mordo-te quando estás no sofá a ver o teu reflexo na televisão. Eu mordo-te quando tu te perdes narcissistícamente nas pupilas dos meus olhos.
Eu só existo por aqui, para te reforçar por contraste a tua identidade. Vou parar hoje por aqui. Dói-me a mão.
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