Sunday, 10 August 2008

Roubaste-me

Eu abro os olhos e não consigo encontrar prazer.


Olho para o céu do meu quarto e não encontro prazer.
Espero mais uns minutos e levanto-me da cama.
Hoje está calor, mas o toque do frio nos meus pés descalços não me dão qualquer prazer.

Caminho completamente acordado até á casa de banho.
Enquanto mijo vou lavando os dentes.
São 11 da manhã e ainda não encontrei prazer.

Olho para onde foge a água do duche
e tento lembrar-me se tenho alguma coisa marcada para hoje.
Nenhuma memória me dá prazer.

Arejo a casa com o mesmo ar de sempre e como sempre nada de novo acontece.
Visto a roupa engomada que está ansiosa por sair,
mas nada diferente acontece.
Eu sinto exactamente as mesmas coisas que sentia quando estava despido.
Não sinto prazer em vestir roupa.

Deixo a porta aberta e convido as moscas a entrar.

Desço até ao café, e peço o que o homem ao meu lado está a comer.
Olho para os ponteiros do relógio e faço contas.
Compreender o relógio não me deu prazer.

Vou a qualquer lado, e durante o trajecto,
altero entre apressar o passo, ou andar devagar á espera de sentir qualquer coisa.
cansaço não é prazer.

Nada fica por tentar.
Dou moedas a quem pede,
e fico á espera do fim do dia para ver se me sinto bem.
Mas não sinto.

Telefono a alguém.

E esse vem ai.
Vamos falar e gesticular,
depois pintamos-nos com guaches, saliva e pastel
para parecermos diferentes de os de ontem.

O plano corre como tem de correr.
E acabamos por fazer coisas que nos fazem passar tempo.
E é disso que todos dizem que precisamos.
Mas não.

Não sinto o tempo a passar.
A carne dos outros ou estica e alimenta bolor
ou encolhe e foge-me.
A minha não.

Acabo sempre por adormecer e acordar
e adormecer outra vez
com a porta aberta
e as janelas raivosas a bater.

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